Qual o modelo de tributação ideal para o século 21?
O Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), debateu as mudanças trazidas pela economia digital, que impõe novos desafios ao modelo tributário vigente.
Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, já sinalizou que assim que a reforma da Previdência sair da fase de comissão, sua prioridade será o texto que muda o sistema tributário brasileiro.
Entre os projetos de reforma tributária que tramitam no Congresso, aquele que tem avançado mais nasceu dentro do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), encabeçado pelo economista Bernard Appy. Sua proposta é baseada na substituição de cinco tributos(ICMS, IPI, Pis, Cofins e ISS) por um único imposto batizado de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Apesar das críticas em relação ao longo tempo de transição (dez anos) entre o modelo vigente e o proposto por Appy, e a resistência política que causa diante da expectativa de perda de receita por parte de estados municípios, a simplificação que essa reforma traria é considerada positiva.
Mas esse seria realmente o modelo tributário ideal para o Brasil se firmar como um país competitivo no século 21? Nos últimos anos, um novo elemento começou a preocupar os governos, que temem perda de arrecadação diante do inevitável avanço da economia digital.
As transações digitais quebraram paradigmas tributários, levando a questionamentos a respeito do local onde os lucros devem ser tributados. Tributar pelo conceito clássico, baseado na presença física da empresa, parece não fazer mais sentido.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a Suprema Corte decidiu na última sexta-feira, 21/06, que varejistas de e-commerce recolham impostos com base nos estados onde as vendas foram realizadas, mesmo que não tenham presença física nesses estados.
Na Europa se estudam mecanismos para tributar o lucro de empresas que operam na economia digital, independentemente de sua presença no país que recolherá o imposto.
Por aqui, Bernard Appy diz que sua proposta de unificar os principais impostos do país seria a base para a tributação de serviços dentro da economia digital.
O economista Fernando Rezende, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), vê a questão por um prisma diferente. Para ele, não há como se adequar a esse novo modelo de economia sem encontrar outras formas de se financiar a Previdência.
“O mercado de trabalho também está mudando com a economia digital. A tendência é que a erosão que acontece na Previdência aumente rapidamente nos próximos anos”, disse Rezende nesta segunda-feira, 24/06, durante reunião do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
A desintermediação da atividade produtiva causada pelas transações digitais acaba com a cadeia produtiva tradicional, o que, por consequência, afeta o emprego tradicional.
“Por isso, o primeiro passo é cuidar do regime da Previdência, porque as mudanças no mercado de trabalho são rápidas. Depois podemos discutir o restante das mudanças”, disse Rezende.
O temor do professor da Ebape é que a rigidez das normas no Brasil faça o país ficar para trás na adequação a essa nova realidade da economia mundial.
“Com a velocidade das mudanças que estão em curso, o principal risco que vejo é que qualquer discussão de uma PEC do sistema tributário aumente o texto da Constituição. Vamos acabar colocando na Constituição um dispositivo transitório a espera de uma legislação, que nunca virá”, disse.
Rezende lembra que, enquanto na Europa estão discutindo formas de registrar as empresas globais em um único local, no Brasil ainda não se conseguiu implantar o Cadastro Único de Contribuintes.
O impacto da economia digital é tratado em âmbito dos governos europeus como uma maneira de acabar com a desigualdade de tributação entre as empresas tradicionais e aquelas que operam na economia digital.
Na Europa, a tributação sobre o lucro chega a 23,2% para as empresas da economia tradicional, enquanto que para uma empresa que opera no e-commerce, ela varia de 8,9% a 10,1, segundo dados do Ecofin, uma espécie de Confaz Europeu.
Nos Estado Unidos a Suprema Corte decidiu favoravelmente aos governadores, que afirmaram que as vendas online estavam resultando em predas bilionárias para a arrecadação.
O Brasil, segundo Rezende, figura entre os protagonistas de mudanças nos modelos tributárias – foi um dos pioneiros na implantação da tributação sobre valor adicionado, por exemplo. Sendo assim, segundo ele, saberá aproveitar o momento de discussão de uma reforma tributária ampla para definir qual será seu papel dentro da economia digital.
Por Renato Carbonari Ibelli
Fonte: Diário do Comércio